Natural Running Parte II



Dando continuidade à nossa série de posts sobre natural running, hoje falaremos sobre as lesões associadas à corrida. Para citar algumas delas podemos lembrar da síndrome do trato íliotibial, síndrome do patelo femoral, fraturas por estresse, tendinopatias, fasciíte plantar, dentre outras.
 
Um ponto interessante é que independentemente do seu nível técnico, da sua pisada, do tênis que você usa, do terreno em que treina você deverá ter algumas lesões ao longo da sua carreira de atleta. Os números são assustadores. Nos diversos estudos observados, os números variaram de 29% até mais de 70%. Uma possível causa para uma variação tão grande nos números pode estar relacionado ao nível de treinamento da amostra utilizada, pois quase todos os trabalhos que usaram tratamento estatístico procurando relacionar (correlacionar) lesões com algumas variáveis, encontraram resultados significantes para a variável tempo de treino (há quanto tempo o atleta treina). Em geral, pelo que se viu na literatura, os atletas mais treinados (em termos de anos de atividade) apresentam menos lesões. Além disso, a distância percorrida por semana (volume de treino), bem como o terreno em que se treina parecem ter alguma importância.
Um ponto extremamente relevante, como demonstrado pelo estudo de Kaplan et al (An Epidemiologic Study od Benefits and Risks of Running. Journal of the American Medical Association. V 17 (23), 1982) é a relação entre o volume semanal de treino e o percentual de atletas lesionados (no período de um ano). Com base no estudo, se você treina (corrida) até 15 km por semana, o seu risco de se lesionar fica em cerca de 20%, caso você treine entre entre 16 e 31 km, seu risco de lesão sobe para 22%. No intervalo entre 32 e 47 km o seu risco já vai para cerca de 34%. Entre 48 e 63 km por semana ele vai para 38%. Na faixa entre 64 e 79 km ele já sobe para 58% e caso você treine acima de 80 km a probabilidade de lesão é de 72%. Assim pode-se inferir que o volume mensal ideal fica entre 48 e 63 km por semana. Uma alternativa interessante, como pode ser verificado na literatura, diz respeito ao treino na água. Alguns estudos, que podem ser verificados na bibliografia do assunto, apontam que correr na água (piscina funda, por exemplo) diminui bastante o risco de lesões, sem perdas significativas de condicionamento. É claro que você teria que selecionar o tipo de treino a ser feito na água. Não dá para treinar tiros de 1 km na água, mas uma corrida leve, apenas para ganhar milhagem, poderia ser feita na água. Outra alternativa é otimizar os Km de treino e treinar menos (Km), mas melhor.
A Dissertação de Mestrado, apresentada por Vitor Daniel Tessutti, junto à Faculdade de Medicina da USP, em 2008, com o título “Distribuição Dinâmica das Sobrecargas no Pé Durante a Corrida em Diferentes Pisos” mostra que correr na grama, ao invés de no asfalto pode ser uma boa forma de minimizar o risco de lesões, em função do menor impacto.
Uma boa referência, caso você queira se aprofundar no tema, pode ser encontradas nas indicações bibliográficas listadas na aba de bibliografia de triatlo.
Bom, mas o post não é sobre natural running? É! Eu sou simpático e adepto do natural running, mas acho que precisamos ir com um pouco de calma no assunto. Existe uma pressão muito grande das empresas que produzem os chamados tênis minimalistas. A pressão dá-se via propaganda e financiamento de pesquisas. Então pessoal, vamos com calma. A maior parte dos estudos mostram que não existem evidências científicas relacionando o uso de tênis minimalista com redução de lesões. Meu temor é que se eles forem usados de forma inadequada, em situações nas quais não sejam os mais indicados, as lesões podem aumentar.
Se você:
  1. Estiver com sobrepeso;
  2. Não fez um treino de musculação específico para “mudar” a forma de correr;
  3. Começar correndo grandes distâncias com um tênis minimalista (meia maratona, maratona); ou
  4. Pisar de forma inadequada (outro dia vi aqui em Santos uma pessoa “quicando”, pisando com a pontinha do pé! Provavelmente ele achava que estava correndo “na moda”, apesar do tênis dele ter bastante amortecimento (e não um minimalista). Ele deve ter se lesionado, pois a sua forma de correr, a sua técnica estava totalmente equivocada. Vamos com calma...
Como eu disse, sou suspeito para falar, pois sou fã do método, tendo feito inclusive um curso sobre natural running na California, mas não recomendo para todos. E digo mais, você pode correr de forma natural (natural running) calçado e com tênis com amortecimento. Não tem problema é só mudar a forma de pisar. Aliás, para grandes distâncias, como uma maratona, acho legal ter um pouco de amortecimento. Não precisa ser muito, mas um pouco pode ser legal. Alguns tênis da Nike e da Zoot se encaixam neste conceito.
Para Finalizar o post, vou citar um material bem legal, do Marcos Duarte da USP, chamado Mitos e Falácias sobre Tênis de Corrida. Ele cita vários estudos mostrando os objetivos e as conclusões, dos mesmos. O resultado é que ainda não temos evidências fortes, embora do ponto de vista da física, eu ache que o natural running faça mais sentido, mas este é o tema do post da semana que vem (terceiro da série). Assim, pense sempre nos interesses por trás de alguma “propaganda” para você começar correr num minimalista “radical”. As evidências encontradas até hoje ainda não são fortes o suficientes para comprovar a superioridade de um modelo em relação ao outro. A minha sugestão é para você experimentar com calma, buscar orientação profissional, fortalecer os grupos musculares adequados e, por favor, mas por favor mesmo, não corra “quicando”, afinal de contas um dos princípios do natural running é um número de passadas de 180 por minuto (o que não permite que você fique quicando).
Vamos aos textos analisados pelo Marcos Duarte:
Foot strike patterns and collision forces in habitually barefoot versus shod runners (Lieberman et al, 2010)
Objetivo: Determinar as diferenças entre correr descalço e calçado.
Resultado: Correr descalço gera menos impacto.
Biomechanical and physiological comparison of barefoot and two shod conditions in experienced barefoot runners (Squadrone e Gallozzi, 2009)


Objetivo: Comparar correr descalço com correr calçado.
Resultado: Correr descalço produz menor impacto e menor gasto energético.

Do you get value for money when you buy an expensive pair of running shoes? (Clinghan et al, 2008)
 

Objetivo: Determinar se calçados mais caros fornecem mais amortecimento que calçados mais baratos.
Resultado: Tanto calçados caros como baratos fornecem o mesmo amortecimento. Não houve relação entre conforto e custo do calçado.

Hazard of deceptive advertising of athletic footwear (Robbins e Waked, 1997)

Objetivo: Determinar se a propaganda que o calçado fornece melhor proteção (o que não é verdade) afeta a forma de pisar do usuário do calçado.
Resultado: A falsa propaganda resultou em forças (impactos) maiores na aterrissagem. Humanos são menos cuidadosos quando se sentem mais seguros.

Incidence and determinants of lower extremity running injuries in long distance runners: a systematic review (Gent et al, 2007)

Objetivo: Determinar quais são as principais lesões em corredores e fatores de risco.
Resultado: Entre 19 e 79% dos corredores tem lesões nas pernas. A região mais lesionada é o joelho. Os principais fatores de risco são: distância total percorrida por semana e histórico de lesão.






 

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